As
crianças dependem dos adultos para garantir a sua sobrevivência!
E então como fica a
construção da autonomia?
O
ato de cuidar pode ser pensado no sentido de ajudar a criança em seus desafios,
objetivando o desenvolvimento de sua autonomia. Para Kamii (1986, p. 36), “a
essência da autonomia é que as crianças tornem-se aptas a tomar decisões por si
mesmas levando em consideração os fatores relevantes para agir da melhor forma
para todos”. Neste sentido, embora as crianças dependam das ações do professor,
este pode ir propiciando ações concretas no sentido de levá-las à
independência, estimulando-as à tomada de decisões, em suas escolhas,
proporcionando interações com o outro, com os objetos e com o espaço. Assim, a
organização do espaço pelo professor deve considerar o desenvolvimento da
cooperação e da superação.
Ao
organizar o espaço da sala de aula, por exemplo, deve projetar o ambiente de
forma criativa, observando o cotidiano da criança. Onde ficará a água? Longe ou
perto do alcance dos pequenos? Os brinquedos, livros e fantoches? Como
desenvolver a rotina, de maneira a organizar o trabalho pedagógico e ao mesmo
tempo possibilitar um ambiente de interação?
De
acordo com o RCNEI (1998b, p. 24), “cuidar significa valorizar e ajudar a
desenvolver capacidades. O cuidado é um ato em relação ao outro e a si próprio
que possui uma dimensão expressiva e implica em procedimentos específicos.”
Com
efeito, a concretização da concepção de educar e cuidar em práticas educativas
aponta um grande desafio para os profissionais da educação infantil e
familiares. Tal questão aponta a estreita relação entre as instituições
educação infantil e família, sendo que ambas precisam ter clareza de seus
papéis e responsabilidades.
O
educador infantil tem um compromisso ético que é evidenciado na sua relação com
a criança. Observe a citação a seguir: “a
primeira função da educação é ensinar a ver – eu gostaria de sugerir que se
criasse um novo tipo de professor, um professor que nada teria a ensinar, mas
que se dedicaria a apontar os assombros que crescem nos desvãos da banalidade
cotidiana” (Alves, 2004).
Refletir sobre o pensamento
de Rubem Alves (2004) sobre a ação do professor é investir num processo ensino
e aprendizagem em que estão envolvidos, além do educador, os desejos,
curiosidades, necessidades e interesses dos educandos. Neste sentido, o
professor sabe que toda a criança, principalmente a da educação infantil, ao
entrar na escola pela primeira vez, está curiosa e quer conhecer o novo, o
diferente. Neste contexto, tem a necessidade de expressar-se. Pensando nisso, o
professor pode organizar um ambiente onde ela possa atender a sua necessidade
de tocar, sentir, ouvir, falar, movimentar e demonstrar suas emoções e
sentimentos. O educador, nesse momento, pode aproveitar para estimular e
orientar as vivências da criança, o que favorecerá o desenvolvimento da
socialização, integrando numa abordagem dinâmica o cuidar e o educar.
Neste sentido, a prática
pedagógica do educador considera a criança um sujeito de direitos, como a
própria constituição aborda, um sujeito de direitos à infância, ao brincar, ao
conhecer, ao questionar, ou seja, que constrói também os seus saberes. Estas
ações possibilitam uma educação que liberta e o papel do professor, nesta
perspectiva, é o de mediador e não de detentor do conhecimento. Contudo, Freire
(1986, p. 46) aponta que “a educação libertadora é, fundamentalmente, uma
situação na qual tanto os professores como os alunos devem ser os sujeitos
cognitivos, apesar de serem diferentes.”
Com efeito, o professor que
desejar despir-se de pré-conceitos em relação às condições sociais e econômicas
das crianças irá refletir sobre a infância em sua totalidade, mas percebendo a
individualidade de cada criança, que traz consigo uma história de vida. Assim,
o professor, ao iniciar uma atividade educativa, pode propiciar momentos de
troca, de interação, estimulando a reflexão sobre os saberes e ideias entre as
crianças. Neste momento, a ação mediadora do professor ocorre por meio de
questionamentos, dinamizando o diálogo com seu conhecimento para que as
crianças sintam-se à vontade para expor suas falas, suas opiniões e, portanto,
possam conhecer realidades distintas àquelas em que estão inseridas.
É fundamental que o
professor e todos os adultos envolvidos no processo de ensino e aprendizagem na
educação infantil tenham consciência de que a construção do conhecimento
somente é significativa quando há troca e sentimento de reciprocidade entre os
sujeitos, quando um valoriza e sabe que pode aprender com o outro, através da
convivência e das relações estabelecidas por meio da diversidade cultural. O
trabalho do educador, neste sentido, exige do professor uma postura objetiva,
clara e consciente, que envolve criatividade e transformação, priorizando uma
prática voltada às necessidades e interesses do educando, descentralizada de si
mesmo e de seus pré-conceitos.
A formação de docentes
também precisa buscar metodologias que possibilitem a construção de sua
identidade profissional desde a sua formação inicial e continuada, na
(re)elaboração diária e contínua da qualidade de sua prática pedagógica, além
de buscar o reconhecimento e a valorização do seu trabalho. Como todo o
profissional da educação, o educador infantil necessita compreender-se
principalmente enquanto um sujeito que aprende, sabendo que o seu fazer docente
se constrói a partir de reflexões, análises e reconstruções acerca de si mesmo.
Assim, a inserção deste profissional na realidade escolar, o relacionamento
estabelecido com os educandos, com as suas famílias, com os outros
profissionais envolvidos e com a comunidade escolar, de forma integrada, são
instrumentos válidos para qualificar sua prática e assim possibilitar eixos
condutores qualitativos para um processo educativo pautado nos princípios de
uma educação emancipadora e libertadora.
A afetividade, inserida nas
relações cotidianas estabelecidas entre adulto e criança na educação infantil, para
Bassedas, Huguet e Solé (1999, p. 132), é indispensável para que o educando
sinta-se seguro e possa ver no professor a figura de alguém que “possa cuidá-la
e protegê-la, compreendendo-a em suas interrogações e angústias para poder
explorar e estimular todas as suas capacidades”. Neste sentido, as autoras
comentam que o professor é um referente, um interlocutor, uma ajuda no processo
do crescimento infantil.
Nas suas palavras: “Na
escola, encontramos uma grande variedade de situações nas quais os meninos e as
meninas manifestam sua alegria, a sua insegurança, os seus temores. É muito
importante a maneira como as educadoras tratam essas situações para que se
consiga o bem-estar necessário da criança, para que ela possa aprender e
desenvolver-se com segurança” (Bassedas; Huguet; Solé, 1999, p. 133).
Neste sentido, as situações
educativas vivenciadas pelo educando na escola e o tratamento por ele recebido
a partir das relações com as pessoas envolvidas com as ações de cuidado e
educação também serão muito importantes na formação do conceito de si mesmas.
Sobre esse aspecto Bassedas,
Huguet e Solé (1999, p. 54) destacam: “Paralelamente, à função social da escola
infantil, é preciso recordar que, como todas as outras etapas, a sua função é
também educativa; seu trabalho deve desenvolver ao máximo as capacidades de
todos os alunos, através dos conteúdos educativos próprios para a etapa”.
Com efeito, a escola
infantil precisa organizar a proposta pedagógica a partir de situações e
experiências que possibilitem a aprendizagem de habilidades, atitudes,
conceitos e, neste sentido, ampliar o desenvolvimento das capacidades que estão
inseridas neste processo. Educar, nesta perspectiva, significa, portanto,
proporcionar à criança tempo, espaço e vivências de formas e natureza diversas,
através dos recursos da ludicidade, das trocas, das oportunidades de expressão
e representação que contribuam com a potencialidade de a criança reconhecer-se
enquanto sujeito, de conhecer e estar com outras pessoas, convivendo e
aprendendo com a diversidade sociocultural.
FONTE:
Rau, Maria Cristina T. D. Educação Infantil: Práticas
pedagógicas de Ensino e Aprendizagem. Curitiba: INTERSABERES, 2011.
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